Rojas sonha em voltar ao São Paulo; ex-goleiro quer reparação do passado
Luciano Borges
“Eu amo o São Paulo. É minha prioridade número um”. Vinda do ex-goleiro Roberto Rojas, esta frase pode parecer uma simples declaração de amor ao clube onde jogou por três temporadas (1987 a 1989), que o tirou do ostracismo no início dos anos dos anos 90 e que ele dirigiu como treinador em 2003. Mas aos 57 anos, Rojas acha que uma volta ao clube paulista vai reparar uma injustiça cometida contra ele.
Primeiro, a saúde.
O chileno, ídolo em seu país onde é conhecido pelo apelido de El Condor e foi eleito como o melhor goleiro da história do Colo Colo, se recupera de um transplante de fígado. A cirurgia foi feita no final de março deste ano, depois de cinco de espera.
Hoje, ele quase não sai de casa, na zona sul de São Paulo. “Ele não pode encarar aglomerações sob o risco de contrair algum vírus ou bactéria. No momento isso é muito perigoso porque ele está com pouca defesa no organismo”, diz Viviane Bruno, esposa de Rojas.
Roberto ingere 16 comprimidos por dia, alguns deles imuno supressores que tentam fazer com que o fígado transplantado não sofra rejeição do organismo. A coloração da pele já voltou ao normal. Ele está mais magro. Pesava 82 quilos, caiu para 65 e já tem 70 kg. Segue uma dieta rígida.
O que motiva Rojas a lutar para se recuperar do transplante é uma conversa que teve ainda no Hospital Albert Einstein, logo depois da cirurgia. O ex-árbitro Olten Ayres de Abreu, hoje integrante do Conselho Deliberativo do São Paulo, fez uma visita e levou com ele um cartão e um recado.
O cartão de visitas era do presidente Carlos Miguel Aidar, que pediu para Olten colocar Rojas em contato com ele por telefone. “Eu falei com ele. Ele me desejou pronta melhora e pediu para mantê-lo a par da minha recuperação. Depois que eu estiver bem, e isto deve ocorrer no final do ano, ele me disse que vou exercer alguma atividade dentro do São Paulo”, contou ao Blog do Boleiro.
A função sequer está definida. “Não sei onde nem em que lugar. Vou cuidar da saúde primeiro”, afirmou Roberto.
Foi na gestão de Aidar em 1987 que o São Paulo trouxe Roberto Rojas – então principal atleta da seleção chilena – para ser titular da posição. Ele jogou 40 partidas e manteve uma disputa pela camiseta número um com Gilmar Rinaldi, hoje coordenador de seleções da CBF.
Dois anos depois, Rojas cometeu o maior erro da carreira, ao cortar a própria testa com uma lâmina durante o jogo entre Brasil e Chile, no Maracanã, pelas eliminatórias da Copa do Mundo disputada em 1990 na Itália.
Ele aproveitou que um sinalizador da Marinha, disparado da arquibancada do Maracanã por uma torcedora, caiu perto dele para simular o ferimento. A ideia era suspender a partida e levá-la para campo neutro.
A farsa foi descoberta. Rojas confessou o erro. Foi banido do futebol pela Fifa. Se tornou um pária no Chile, onde antes era ídolo. Só voltou ao trabalho no futebol depois que o técnico Telê Santana, então no São Paulo, conversou com ele em um hotel de Santiago, em 1994. “Ele me convidou para trabalhar no São Paulo e fui ser treinador de goleiros”, lembra Rojas.
Em 2003, depois da demissão de Oswaldo de Oliveira, Rojas e Milton Cruz assumiram o comando do time no Campeonato Brasileiro e, no final deste ano, levaram o São Paulo à vaga da Libertadores de 2004.
Roberto Rojas mostrou o desejo de ser efetivado como técnico. O presidente da época, Marcelo Portugal Gouveia, e o então diretor de futebol Juvenal Juvêncio decidiram contratar Cuca e não devolveram Rojas ao cargo de preparador de goleiros.
A HISTÓRIA DA INJUSTIÇA
A história da injustiça, segundo Roberto Rojas, começa aí.
“Acho até hoje que Cuca pediu minha saída. Não fui consultado para nada. Juvenal me chamou e ordenou que eu cuidasse da base em Barueri”, falou referindo-se a um Centro de Treinamento de propriedade de José Roberto Guimarães, técnico tricampeão olímpico de vôlei.
Na época, ir para Barueri era considerado castigo para qualquer jogador do profissional. Rojas conta que as condições de trabalho eram ruins. “Não havia estrutura para os garotos. Até o gramado do campo de treino era ruim. Segurei por dois anos e aí pedi demissão. Fiquei muito incomodado”, disse.
Na conversa com Carlos Miguel Aidar, Rojas contou esta história. Ouviu então a promessa de ter emprego no clube quando puder trabalhar normalmente.
Desde 2005, Rojas trabalhou na Ponte Preta, Comercial de Ribeirão Preto e no Sport Recife. Teve que abandonar o trabalho por conta dos problemas de saúde.
Se tudo der certo, as desventuras em série do ex-goleiro vão terminar.
DESVENTURAS EM SÉRIE
Há cerca de 20 anos, Rojas foi contaminado com o vírus da hepatite C numa transfusão de sangue. Em 2009, descobriu que o fígado estava condenado.
Ele entrou para a fila de transplante.
Em dezembro de 2014, teve outra surpresa desagradável: durante o sono ele sofreu uma torção do lóbulo medial do pulmão e teve que ser operado no dia de natal. Esta parte foi retirada depois de uma cirurgia invasiva. Até hoje, Rojas sente dores no peito. ''Mais até do que no fígado transplantado, que não dói”, diz Viviane.
Por conta desta intervenção cirúrgica, Rojas ficou internado por 45 dias no hospital. Chegou a perder a vaga na fila do transplante, quando apareceu um doador. Tinha que esperar para poder passar por outro procedimento invasivo.
Esta sequência de problemas impediu Rojas de aceitar o convite de uma emissora de televisão do Chile para ser comentarista na Copa América que começa nesta quinta-feira. “Queria muito estar lá, mas não posso. Tenho restrição dos médicos até para falar. Não posso ter complicação com o fígado”, disse.
Além disso, um troféu e uma placa do Colo Colo esperam por ele em Santiago. Rojas foi eleito o melhor goleiro da história centenária do clube mais popular do país. Na festa dos 100 anos, ele gravou uma mensagem que foi vista por outros ex-ídolos.
Rojas dorme cedo. Descanso é fundamental. Ele está motivado a seguir as determinações médicas ao pé da letra. Quer voltar a trabalhar. “Ele sonha com isso: ter uma atividade dentro do futebol. Se for no São Paulo então, será o máximo”, disse Viviane Bruno.
O Blog do Boleiro tentou falar por telefone com Juvenal Juvêncio e Cuca. Não foi atendido.